O Som do Silêncio

Mais turvo, menos turvo, tudo turvo
Sem estrutura, forma, cor ou peso
O resto é o resto, tudo o que não vejo
Que silêncio, meu Deus! Que escuridade!

Mas sinto o sacro fogo arder no peito
Quantas vezes, o Amor, me tem ferido?
Meus ais são de ternura ou desengano?
As Musas me fizeram desgraçado?

Qual vida não merece ser vivida?
Contra os sentidos a razão murmura:
Mortal, sejas mortal; durar não podes.

Minha voz pelo poema desencarna
E o canto reverbera ao som da Lira
Ide, meus versos, tocar o silêncio.

Escuridão, oh! minha velha amiga.

Carrego Comigo

Trago guardado num canto recôndito
Um canto, pois, que a minha voz derrama
Neste pranto, estes ais, com que suspiro
Na chama inexovel da saudade.

Este canto, este som, que vem de dentro
Dos meus gemidos, grimas e amores;
Minh’alma quer lutar côs desenganos
Isto faz da minh’alma puro canto.

Alma minha cruel, que te partiste
Ó Musa que mantém minh’alma presa
Oh, alma da minh’alma, a ingrata, a bela!

Meu canto sufocado em contracantos
Que as vozes de alegria em ais convertem
Ó, doce lira, cesse os versos tristes.

Meu canto não vale um sero conto.

Exéquias

De joelhos aos teus pés, oh doce infanta
Trago-te queixa, solidão e pranto
Ao som de samba, rumba e jazz, no entanto
Não mais invocarei-te ó musa errante.

Imaginei-me bom, culpado sendo
Sem ser amado, fui feliz amante
Daquela cujo nome habita as hostes
celestiais, mas sem nome aqui jamais.

Tão longe de ti estou, e estou tão perto
Tão perto, não importa o quão distante
Porquanto o céu e a terra não se explicam.

A vida inteira pra esquecer-te, ingrata
Minha amada hoje entre hostes celestiais
Ausente do meu mundo a cada instante.

Convite

Custa-me pensar
Que o convite que não fiz
Nem irei fazer
Você pudesse aceitar.

Conversaríamos num bar
Ou num café, quem sabe?
A tarde talvez fosse azul
Não houvesse tantos desejos.

Riríamos… sorrisos amigáveis
Seríamos agradáveis
Um com o outro.

(Em vez da indelicadeza
Desatenção
E da falta de educação)

– Melhor não termos motivos
Para arrependimentos.

Brancaflor-Cantiga de Escárnio

Se todo poeta cantasse o amor
Não existiria lugar pro desamor,
A ironia, o sarcasmo e o meu furor
Nas ‘cantigas de escárnio’, Brancaflor.

Entrego o dorso nu, oh deusa Helena
Nesta hora que me’é contrária à disputa
Brancaflor, minha musa virou diva:
Ó rima pobre, grave, externa e obscena.

Brancaflor, minha musa virou diva:
Vaca profana de tetas leiteiras
Derrama o leite ruim na minha peia.

Brancaflor, minha musa virou diva:
Cachorra popozuda, aventureira
Sobe, desce e rebola em minha peia.

Brancaflor-Canção de Maldizer

Se todo poeta cantasse o amor
Aí, quem me dera’eu fosse o seu cantor
Pra versar como versa um trovador
‘Canção de maldizer‘ pra Brancaflor.

Se você for minha estrela, um cometa
Em fogos e explosões, quisera’eu tê-la
No palco céu em que estrela, o capeta
Brancaflor, põe mesas à luz de velas.

Mas você não quis me ouvir, Brancaflor
Bailou tanto o corpinho bibe
Que atraiu seu novo amor gigo.

Entrego o dorso nu à deusa Helena
Nesta hora que me’é contrária à disputa
Brancaflor, minha musa virou Diva.

Não quero mais dançar seu pas de deux
Brancaflor, não canto mais pra você.

Brancaflor-Cantiga de Amor

Se todo poeta cantasse o amor
Ai, quem me dera’eu fosse’o seu cantor
Pra versar como versa um trovador
Nas ‘cantigas de amor‘, ó Brancaflor.

Se você for minha estrela, um cometa
Em fogos e explosões, quisera’eu tê-la
No palco céu em que estrelar, capeta
Ó Brancaflor, põe mesa à luz de velas.

Entrego o dorso nu, ó Brancaflor
A sua atrocidade – tange a lira
Retesada – oh, musa, chore comigo!

Tristeza de guardar este segredo
Não contar pra ninguém, ó Brancaflor.
Vo não pode ouvir meu canto triste?

Na Balança (In truitina)

(Decassílabos de Carmina Burana)

Ó fortuna, como a lua, és mutável,
Ora tu cresces, ora diminuis;
Detestável vida ora clareia ora
Escurece por brincadeira a mente.

Ó sorte, és monstruosa e vazia, oh!
Tu – roda volúvel – és má; vã é
A felicidade tão dissolúvel
E nebulosa, que a mim contagias.

Dia, noite e tudo me são contrários.
Teu belo rosto me faz versar mil
Prantos, oh!, tens o coração de gelo.

Serei ressuscitado por um beijo?
Na balança os sentimentos oscilam,
Amor lascivo e pudor, um contra o’outro.

Serenata Sintética

(Meu canto não tem nada a ver com a lua – Caetano)

Salve, ó Lua cândida, atrás dos altos
Montes eternamente noctâmbula
Salve! Salve! ó astro fúlgido, que brilhas
Docemente pela noite de minh’alma.

Meiga lua, linda, recatada e do mar
Os teus segredos onde os deixaste ficar?
Nem tão doirada e crua te levantes, ó lua
Mas venhas triste e nua do prateado véu.

Quantos caminhos até chegar a um beijo teu
Que solidão errante até tua companhia
Rua torta, lua morta, tua porta.

Sinto que nós somos noite, apesar da lua
Que tateamos no escuro dentro da noite veloz
E nas cinzas das horas nos dissolvemos.