A Cinza das Horas

E dessas horas ardentes ficou esta cinza fria – Manuel Bandeira

Passar aflito o dia, o mês e o ano
Traidoras horas de enganoso encanto
(Parece a que a dor as faz pesadas!)
Que o tempo que se vai não torna mais.

A vida ao mau destino es sujeita
Que talho o meu pesar em decassílabos:
Da alegria e prazer breves ufanos
Da paixão e do amor mágoa infinita.

Bárbaro tempo! horror da humanidade!
Lembranças que se perdem da memória
Quão raríssimas horas de alegria.

Meu peito infeccionou côa vil torpeza
Da ingrata condição, senil, volátil;
O tempo a me soprar fervor humano.

A lembrar-me (ai de mim!) da mortal hora.

E Se (a morte de Deus)

E Se não existisse Deus criador
Juízo final, pecado original;
Flores do Mal, fortuna ou infortúnio?!
– Irrompe em meu esrito a veemência.

E Se Nietzsche estivesse co’a razão:
Das ilações desse marrio insano
– Oh Religião, muleta existencial !!! –
Exaltou-se as traições, amou-se o engano.

Sociedade sem classes; paraíso
Sem castas tecnocratas; tudo entrava
Na imperfeição da vil humana raça.

Desisto! Não existe este amanhã;
Na curtíssima, absurda e inútil via
Vou levando sem rumo o curso errante.

Em meus versos teu nome profanado.

Exéquias

De joelhos aos teus pés, oh doce infanta
Trago-te queixa, solidão e pranto
Ao som de samba, rumba e jazz, no entanto
Não mais invocarei-te ó musa errante.

Imaginei-me bom, culpado sendo
Sem ser amado, fui feliz amante
Daquela cujo nome habita as hostes
celestiais, mas sem nome aqui jamais.

Tão longe de ti estou, e estou tão perto
Tão perto, não importa o quão distante
Porquanto o céu e a terra não se explicam.

A vida inteira pra esquecer-te, ingrata
Minha amada hoje entre hostes celestiais
Ausente do meu mundo a cada instante.